A DEVOÇÃO DO CORAÇÃO
Os capítulos cinco, seis e sete de Mateus constituem o chamado “sermão
do monte”. Nesse discurso, Jesus apresenta uma nova visão sobre a vida
espiritual, contrastante com a noção de espiritualidade legalista e formal que
os religiosos, de sua época, ensinavam ao povo. Por serem muito focados no
cumprimento da Lei e na prática do ritual religioso, o resultado de seus
ensinos era, na maioria das vezes, o desenvolvimento de uma religiosidade morta
e fingida diante de Deus e dos homens.
Jesus, então, fala, entre outras coisas, sobre o que chamamos de “a
devoção do coração”. Ele diz: “tenham cuidado de não praticar as ‘obras de
justiça’ diante dos outros para serem vistos por eles... quando você der
esmola, não anuncie isso com trombetas, como fazem os hipócritas nas sinagogas
e nas ruas para serem honrados pelos outros... E quando vocês orarem, não sejam
como os hipócritas. Eles gostam de ficar orando em pé nas sinagogas e nas
esquinas, a fim de serem vistos pelos outros... Quando jejuarem, não mostrem
uma aparência triste... para que não pareça aos outros que você está jejuando,
mas apenas a seu Pai que vê em secreto. E seu Pai, que vê em secreto, o
recompensará (Mateus 6:1-18).
Observe que a devoção, isto é, o fervor espiritual, a piedade, a
dedicação às coisas de Deus, que Jesus ensina contempla, entre outras
disciplinas espirituais, a ajuda aos necessitados, a oração e o jejum. Há
outras práticas espirituais, é claro. Mas tomando apenas esse trecho do “sermão
do monte”, Jesus fala sobre a tentação da pessoa, ao praticar sua
espiritualidade, fazê-lo apenas como meio de promover-se, de satisfazer o ego e
buscar aprovação e admiração. Isso é falsa devoção, pois a verdadeira consiste
em um movimento do nosso coração em direção, unicamente, a Deus.
Essa questão tratada por Jesus é relevante, pois fala sobre o sentido da
verdadeira devoção a Deus. Precisamos olhar a nossa prática devocional e
verificar se ela é, de fato, dirigida a Deus e não a nós mesmos. Se naquela
época havia esse desvio da ostentação de falsa espiritualidade, hoje,
observa-se um estilo de devoção que transforma os cristãos em consumidores de
bens religiosos. Muitos se sentem cristãos porque participam de seminários e
simpósios sobre temas religiosos, porque assistem a cultos, curtem músicas
evangélicas e leem livros sobre temas bíblicos. Ao fazermos tais coisas estamos
fazendo-as para Deus ou preenchendo nosso vazio?
A devoção voltada para Deus, isto é, “a devoção do coração” produz
efeitos positivos e libertadores para o cristão. Mas muitas atividades
religiosas não passam de entretenimento. Note que nesse trecho de Mateus Jesus
fala de práticas devocionais de natureza espiritual (jejum e oração) e outra de
cunho social (ajudar o necessitado). Isso mostra que a devoção a Deus envolve
não apenas exercícios espirituais, mas também um olhar e um movimento de amor
em direção ao outro.
Esse aspecto da espiritualidade cristã é uma tônica no ensino de Jesus.
Na Queda, isto é, no pecado original, o homem se separou não apenas de Deus,
mas também do próximo, do semelhante. Agora, ele não vê o outro como irmão, mas
como concorrente. Assim, busca controlar e usar o outro como propriedade sua.
Isso constitui grave ofensa a Deus, pois o outro carrega consigo a “imagem e
semelhança” de Deus. Por essa razão, ao ser perguntado sobre qual seria o maior
mandamento, Ele respondeu que era “amar a Deus de todo o coração”, mas,
imediatamente, fez questão de dizer que o segundo maior é “ame o seu próximo
como a si mesmo” e que toda a Lei depende desses dois mandamentos
(Mateus22:34-40). Precisamos analisar a nossa devoção a Deus.
Antônio Maia – M. Div
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