JESUS, INCOMPREENDIDO. PARTE II


 

Como visto na primeira parte dessa reflexão, até mesmo os discípulos, que eram tão próximos a Jesus e caminhavam com Ele, não o compreendiam, de início. A causa, como dito, era o fato de que eles esperavam um Messias político-nacionalista que libertaria Israel do império romano e o elevaria a uma posição importante entre as nações. No entanto, Jesus não se envolvia com política, era profundamente espiritual e afirmava que seu “Reino” não era deste mundo (João 18:36). Na verdade, o centro de seu ensino e pregação era, exatamente, o “Reino de Deus” (Lucas 6:20; 8:10; 9:62; 10:9; 11:2; 11:20; 12:31; 13:29; 16:16;17:20,21; 18:16,24; 21:31; 22:29,30).

Assim, tendo já discorrido sobre essa questão política que levava à incompreensão da pessoa de Cristo pelos seus discípulos e outras pessoas de sua época, o presente texto se debruça sobre o aspecto espiritual de Jesus. Obviamente, por questão de espaço, não serão tratados o seu nascimento sobrenatural e o fato de Ele nunca ter cometido pecado, isto é, a sua vida de obediência e santidade. Serão comentados apenas, de modo breve, a sua vida de oração, o seu ensino e os milagres que Ele realizou.

Dito isso, de acordo com aqueles que andaram com Ele, Jesus era um homem que nutria uma vida profunda de oração. Essa prática da vida espiritual tinha, para Ele, um sentido diferente do praticado na época. Para Jesus a oração não podia ser usada como elemento de ostentação de aparente espiritualidade como faziam os religiosos de seu tempo (Mateus 6:5), nem muito menos ser entendida como mero rito ou rotina religiosa (Mateus 6:7,8) como faziam os pagãos.

Para Jesus, a oração significava, verdadeiramente, falar com Deus, a quem Ele chamava de Pai. Era a oração, aliada à presença sem medida do Espírito em seu ser (João 3:34), que o mantinha em comunhão constante com o Criador, fato esse que lhe conferia a certeza de sua identidade divina, sua força para vencer as tentações e o pecado e seu poder para realizar milagres. Diversos relatos sobre sua prática de oração mostram que ela constituía uma das marcas profundas de sua espiritualidade (Mateus 14:23; 26:36-46; Marcos 1:35; Lucas 3:21,22; 6:12-16; 9:28-36).

Já no tocante ao seu ensino e pregação, as pessoas viam com espanto e admiração o seu conhecimento profundo da Lei, a originalidade de seus discursos e a autoridade com que falava (Marcos 1:21,22,27,28; 6:1-3; João 6:42). E sobre o que Ele dizia, Jesus disse, claramente: “não falei por mim mesmo, mas o Pai que me enviou me ordenou o que dizer e o que falar... portanto, o que eu digo é exatamente o que o Pai me mandou dizer” (João 12:49,50, conforme João 3:34). No sermão do monte, é notório o fato de que Jesus, diversas vezes, se colocou acima da Lei, proferida por Moisés. Ele dizia: “foi dito: aquele que... Mas eu lhes digo...” (Mateus 5:21,22, 27,28,31,32,33,34,38,39,43,44). Sua compreensão sobre a Lei a tornava ainda mais difícil de ser cumprida.

O evangelista Lucas revela que, com 12 anos, Jesus já debatia com os mestres da Lei, no templo de Jerusalém. Naquela ocasião, “todos que o ouviam ficavam maravilhados com o seu entendimento e com as suas respostas” (Lucas 2:46,47). Mas, como adulto, exercendo uma pregação independente em relação ao templo de Jerusalém e seguido por multidões (Mateus 5:1; 14:13,14; 9::8 21:8; Marcos 3:7-12; 12:12, 37; Lucas 19:3), os religiosos procuravam um jeito de como matá-lo (Mateus 12:14; Marcos 3:6; João 7:25; 8:37,40). Dentro desse contexto, o Apóstolo João relatou que, certa vez, “os chefes dos sacerdotes e fariseus enviaram guardas do templo para o prenderem”, mas eles não o prenderam. Indagados pelos chefes dos sacerdotes, eles disseram: “ninguém jamais falou da maneira como esse homem fala” (João 7:32, 46).  

Outra fonte de incompreensão sobre a pessoa daquele galileu eram os seus milagres. De acordo com aqueles que andaram com Jesus, Ele realizou muitos atos inexplicáveis à luz das leis naturais que regem o mundo físico. Como entender um homem de “carne e sangue” (Hebreus 2:14) que repreende o vento e a fúria do mar, trazendo imediata calmaria (Mateus 8:23-27)? Jesus demonstrou, em muitos milagres, poder sobre a “physis”, isto é, a matéria. Duas vezes Ele transformou poucos pães em uma quantidade suficiente para alimentar uma multidão. Ele também andou sobre as águas do Mar da Galileia, transformou água em vinho e alterou a matéria do corpo de pessoas, em muitas curas, como dar vista a cegos, curar leprosos e paralíticos (Mateus 14:30-44; 15:29-39; Mateus 14:22-36; João 2:1-11; 9:1-12; Mateus 8:1-4; 9:1-8).      

Além desse poder sobre o mundo material, os evangelhos mostram que aquele carpinteiro de Nazaré tinha um incompreendido poder sobre o mundo espiritual. Certa vez, Ele foi à sinagoga de Cafarnaum e, enquanto ensinava, “um homem possesso de um espírito imundo gritou: o que queres conosco Jesus de Nazaré? Vieste para nos destruir? Sei quem tu és: o Santo de Deus!”. Jesus, não querendo que as pessoas viessem a crer na sua procedência divina por intermédio do testemunho de demônios, o repreendeu, dizendo: “cala-te e sai dele!”. Na mesma hora, “o espírito imundo sacudiu o homem violentamente e saiu dele gritando”. E todos ficaram espantados com a autoridade de Jesus sobre esses seres malignos (Marcos 1:21-28). Os evangelhos contêm inúmeros outros relatos de embates de Jesus com esses anjos caídos, nos quais mostram a autoridade de Jesus sobre eles.

Outro aspecto, que é fonte de incompreensão de Cristo por seus contemporâneos é o seu poder sobre a morte. Os evangelhos narram que Jesus Cristo, durante sua ação no mundo, ressuscitou três pessoas mortas (Marcos 5:21-43; Lucas 7:11-17 e João 11). Esses feitos deram a Ele muita notoriedade e multidões o seguiam. Ele mesmo afirmava sobre si: “Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crer em mim, ainda que morra viverá” (João 11:25). Ele falou essas palavras porque sabia que sua morte, na cruz, e sua imediata ressurreição poriam fim à morte, na humanidade, pois abririam um caminho para o homem retornar ao seu Cridor.

Certas falas de Jesus causavam forte incompreensão sobre sua pessoa em seus discípulos e, principalmente, entre os religiosos de sua época. Certa vez, levaram a Ele um paralítico para que Ele o curasse. Jesus, porém, disse apenas àquele homem: “homem, seus pecados estão perdoados”. Segundo essa afirmação, Jesus entendia que Ele tinha poder até para perdoar pecados. Ora, o pecado é o que causa as mortes física e espiritual e leva o homem à condenação de uma vida eterna separada do Criador. Os religiosos, presentes, ficaram escandalizados. Então Jesus disse: “que é mais fácil dizer: os seus pecados estão perdoados ou levantes e ande? Mas para que vocês saibam que o Filho do homem tem na terra autoridade para perdoar pecados – disse ao paralítico – eu lhe digo: levante-se, pegue a sua maca e vá para a casa”. O texto acrescenta que, na mesma hora, o homem se levantou e saiu louvando a Deus (Lucas5:17-26).

Após a morte de Jesus, os religiosos, de sua época, permaneceram não o compreendendo. Mas, os seus discípulos alcançaram pleno entendimento dele com a decida do Espírito Santo. Sobre isso, disse Jesus: “o Conselheiro, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, lhes ensinará todas as coisas e lhes fará lembrar tudo que eu lhes disse” (João 14:26). Nos dias atuais, Jesus permanece sendo um grande incompreendido entre muitos. Sua palavra continua viva, mas como Ele dá testemunho de uma realidade de existência espiritual, muitos não o entendem nem o recebem, pois ela só pode ser discernida pela fé. Contudo, àqueles que se aproximam de Deus e o recebem pela fé, Ele lhes concede o direito de se tornarem filhos de Deus (João 1:12).  

Antônio Maia – M.Div.

Direitos autorais reservados

Comentários

Postagens mais visitadas