A “ESPIRITUALIDADE” DOS CORLEONES
A
“ESPIRITUALIDADE” DOS CORLEONES
Quem
já assistiu ao filme “O Poderoso Chefão” se lembra da cena do batismo do filho
da irmã de Michael Corleone (Al Pacino), que substituía seu pai Don Vito
Corleone (Marlon Brando) nos negócios mafiosos da família. Enquanto o sacerdote
procedia o ritual do sacramento, no qual Michael confirmava sua fé em Deus, na
Igreja e dizia que renunciava ao pecado, chefões mafiosos de Nova York, seus
inimigos, eram cruelmente assassinados por sua ordem. Essa cena desse
emblemático filme do cineasta Francis Coppola nos faz refletir sobre o significado
do que é ser cristão.
Dominado
pelo ódio contra os que tramaram um atentado para tirar a vida de seu pai, Michael
vai a um compromisso religioso e age como se tudo estivesse bem, sabendo,
porém, que pessoas, naquele exato momento, estavam sendo mortas por seu
mandado. Embora a natureza de seus negócios fosse anticristã, a família
Corleone agia com a naturalidade e a decência de pessoas de fé. É claro que
aqui está se falando de um caso de extrema incoerência religiosa. Mas, muitos que
se dizem cristãos, sem se dar conta, por vezes, vivem uma vida distante de Deus
e seus atos religiosos têm uma feição, meramente, social ou cultural.
O
que é, então, ser cristão? Como se vive a vida cristã? Em que ela consiste? Certa
vez um mestre da Lei perguntou a Jesus: “de todos os mandamentos, qual é o mais
importante?”. Citando Deuteronômio 6.5, Jesus respondeu: “ame o Senhor, o seu
Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma, de todo o seu entendimento, e
de todas as suas forças”. Mas Jesus fez questão de dizer o segundo, lembrando
Levítico 19.18: “ame ao seu próximo como a si mesmo” (Marcos12.28-34). Praticamente,
estava dizendo que é impossível amar a Deus sem amar ao próximo e vice-versa.
Ser
cristão é, essencialmente, amar a Deus e ao próximo. A vida cristã consiste de
atos de amor a Deus e ao semelhante. De nada adianta um cristão ir à igreja,
assistir ao culto, ofertar e praticar as disciplinas espirituais do jejum e da
oração, se não houver amor no que faz. O Apóstolo Paulo disse: “ainda que eu
tenha o dom de profecia e saiba todos os mistérios e saiba todo o conhecimento
e tenha uma fé capaz de mover montanhas... ainda que eu dê aos pobres tudo o
que possuo... se não tiver amor, nada disso me valerá” (1Coríntios13.1-3). Ele
escreveu isso porque é possível viver uma vida de aparente espiritualidade, mas
sem nenhum valor para Deus e para a pessoa.
O
amor é sempre um movimento em direção ao outro. Tem um sentido vertical em
direção a Deus e outro horizontal, ao homem. O amor de Deus pelo homem o fez
entrar na humanidade, tomando a forma de um ser humano para salva-lo da morte
eterna, provocada pelo pecado original. O amor do homem por Deus faz ele entrar
na presença divina e sentir um pouco de sua condição inicial. No amor, toda a
falsidade, tão presente nas relações humanas e em atos religiosos, se anula. No
amor só há a verdade. Jesus disse: “eu sou a verdade” (João 14.6). Que as nossas
vidas sejam sempre um aproximar-se de Deus e do próximo em amor. Fazendo isso, estamos
imitando a Cristo, que disse: “amem-se uns aos outros como eu os amei”
(João15.12).
ANTÔNIO MAIA