O HOMEM EM BUSCA DE SI - PARTE II
Por toda a sua vida, o ser humano procura entender o sentido de sua existência. Ao perceber-se, na vasta imensidão do universo, um sentimento de inquietude o domina, pois não consegue entender o seu ser e o mundo, no qual se encontra. É como se faltasse “algo” que explique a razão da existência e o propósito de si e do universo. Essa ausência de sentido e definição lhe imprime uma angústia constante e o leva a viver no tormento que ela lhe causa.
Por esse motivo, desde muito cedo, o homem criou caminhos para empreender uma busca pela compreensão desses mistérios. No entanto, chegará ele a descobri-los por seus próprios esforços? Blaise Pascal (1623 - 1662), pensador francês, entendia que não, pois “se o homem procurasse conhecer a si mesmo primeiro, veria o quanto é incapaz de ir adiante. Como uma parte poderia conhecer o todo?”[1]. No entanto, é essa busca que move a humanidade.
Morto, espiritualmente, por causa da entrada do pecado, em seu íntimo, o homem enxerga só matéria. Mas será que ele a enxerga? Será que, realmente, o ser humano enxerga alguma coisa? Ou ele vê, apenas, vislumbres da realidade que o cerca. E se o que ele procura estiver além de suas percepções sensoriais? Fato é que os sentidos humanos, por causa da Queda, não leem, adequadamente, o mundo.
Pascal, falando dessa limitação humana diz: “nossos sentidos não percebem nenhum extremo: muito barulho nos ensurdece, demasiada luz nos deslumbra, muita distância ou proximidade impede-nos de ver… Eis o nosso estado verdadeiro; é o que nos torna incapazes de saber ao certo e de ignorar totalmente. Vagamos em um vasto meio, sempre incertos e flutuantes, empurrados de um extremo ao outro”[2]. O ser humano vive o suplício de estar preso à noções. Só a verdade o libertará (João 8.32).
Esse tema é dissertado, com mais detalhes, em meu livro O Homem Em Busca de Si - Reflexões Sobre A Condição Humana na Parábola do Filho Pródigo (ebook). Aqui, devido à necessidade de limitar a abrangência deste texto, é refletido, apenas sucintamente, sobre um desses caminhos: a ciência. Mas, na busca por si ou mesmo procurando construir um sentido para sua existência, o homem criou também a mitologia, a religião e a filosofia [3].
Esses saberes moldam as mentes e as sociedades humanas. Embora tenham sua relevância, não se mostraram eficazes, até hoje, para resolver os mistérios que envolvem a origem e o propósito do homem e do universo. Mesmo a ciência, tão bela, empolgante e vasta, mostra-se inútil para responder essas questões que tanto intrigam à humanidade. Ela, como os outros saberes, é imperfeita, incompleta e não alcança a verdade. Apenas aproxima-se.
É verdade: a pesquisa científica levou a humanidade à grandes descobertas e realizações. Mas ela nunca chega ao seu propósito definitivo. É sempre ensaio e erro e aproveita o que se pode de suas descobertas. Mas há sempre efeitos colaterais. Isso nos arremete ao filósofo, alemão, Kant (1724 - 1804). Ele afirma: “o homem não é capaz de um conhecimento absoluto… não conhece o objeto como ele é em si mesmo, como coisa em si, mas apenas como ele se manifesta, aparece, ou seja, como fenômeno”[4].
No mesmo raciocínio, segue o francês Gaston Bachelard (1884-1962), importante filósofo da ciência. Em seu Ensaio Sobre o Conhecimento Aproximado, ele afirma que “o ato do conhecimento não é um ato pleno”. Para ele, é preciso “adotar como postulado da epistemologia o caráter sempre inacabado do conhecimento”. Ele entende que, “no que se refere à natureza, nunca se chega à generalização completa e definitiva” e o erro “obriga a nos contentamos com aproximações”[5].
Mesmo assim, o homem vive na ilusão de que o conhecimento científico é a verdade definitiva e acabada. O estudioso da ciência Thomas Khun (1922 - 1996), porém, entende que “...raramente encontramos áreas nas quais uma teoria científica pode ser diretamente comparada com a natureza, especialmente se expressa numa forma predominantemente matemática. Até agora não mais do que três dessas áreas são aceitáveis à Teoria Geral da Relatividade de Einstein. Além disso, mesmo nas áreas onde a aplicação é possível, frequentemente requer-se aproximações teóricas e instrumentais que limitam severamente a concordância a ser esperada”[6].
Note, então, que o ser humano conhece muito, mas sabe pouco. Veja, por exemplo, a Astrofísica. Depois de milênios de pesquisa, praticamente, voltou ao ponto inicial dos estudos por causa das recentes descobertas produzidas por meio do telescópio James Webb. Os astrofísicos dispõem de um imenso conjunto de dados e informações sobre os corpos celestes, mas ainda não sabem o que é o universo, como ele funciona, qual a sua origem e o seu propósito.
Toda essa dificuldade de o homem entender o mundo tem relação com um texto de quase três mil anos da literatura sapiencial dos judeus. Veja: “tudo fez Deus formoso no seu devido tempo; também pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até ao fim”[7]. Ou seja, sem a ajuda daquele que o criou, o ser humano jamais encontrará o sentido de sua existência. Só no reencontro com o seu Criador, o homem pode reencontrar-se consigo mesmo.
Segundo a sagrada Escritura, o homem é um corpo, misteriosamente, ligado a um espírito. Então, ele precisa considerar a natureza espiritual de seu problema. Para retornar ao seu eu original, o “homem precisa trilhar, pela fé, o caminho aberto por Deus entre as fendas do material e espiritual, descrito nestas palavras: ´eu vim do Pai e entrei no mundo; agora deixo o mundo e volto para o Pai´ (João16.28). Esse caminho, que é Jesus, o Filho, envolve sua encarnação, morte e ressurreição”. Queira ou não, só recebendo pela fé o sacrifício de Cristo poderá o homem, após a sua morte, ressuscitar para o inimaginável, isto é, a vida novamente com Deus” [8].
Antônio Maia - Ph.B., M. Div.
Direitos autorais reservados
[1] PASCAL, Blaise. Pensamentos. Ed Abba Press, São Paulo, 2002, p.65
[2] PASCAL, Blaise. Pensamentos. Ed Abba Press, São Paulo, 2002, p.64
[3] MAIA, Antônio. O Homem em Busca de Si. Reflexões Sobre a Parábola do Filho Pródigo. Amazon,
São Paulo, 2017, 9%
[4] KRASTANOV, Stefan Vasilev. Metafísica II. Batatais: Claretiano, 2004
[5] BACHELARD, Gaston. Ensaio Sobre o Conhecimento Aproximado. Contraponto Editora Limitada.
Rio de Janeiro, 2015
[6] KUHN, Thomas. A Estrutura das Revoluções Científicas. São Paulo, Ed Perspectiva, 2018, p.91
[7] ATUALIZADA, Bíblia Almeida Revista e. Sociedade Bíblica do Brasil. São Paulo, 1999. Eclesiastes 3.11, p 460
[8] MAIA, Antônio. O Homem em Busca de Si. Reflexões Sobre a Parábola do Filho Pródigo. Amazon,
São Paulo, 2017, p.29
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